A história de Valdir Teles, encerrada de forma breve e
incompreensível, se confunde com as linhas das inúmeras poesias que este
menestrel cantou e decantou pelo Brasil e pelo mundo afora. Filho da Paraíba,
mas legitimamente adotado por Pernambuco – São José do Egito, especificamente,
Valdir fez parte de um seleto e refinado grupo de embaixadores que carregavam
nas costas, além da viola, toda a cultura diversa e plural do Nordeste.
Nascido em
Livramento, no Cariri da Paraíba, Valdir veio para o Pajeú de Pernambuco ainda
criança. Por esta ocasião, fez um verso para ilustrar este momento de sua vida:
“Pai
vinha de São José/Com uma bolsa na mão/ Minha mãe abria a bolsa/ Me dava a
banda de um pão/ Porque se desse o pão todo/ Faltava pro meu irmão”.
Aos 11 anos de
idade, ficou órfão de pai. Primogênito de 4 irmãos, Valdir tornou-se o provedor
do lar, passando a empunhar a enxada em meio as lavouras para sustentar sua
família. Aos 19 anos, optou por sair do sertão e com destino a Bahia, tornou-se
operário em regiões de usinas como Sobradinho, Itaparica e Paulo Afonso. Nas
horas vagas, como forma de complementar a renda, também exerceu a função de
fotógrafo, à época chamado de retratista.
No fim dos anos
70, voltou ao sertão pernambucano. Na ocasião, foi apresentado aos poetas
Sebastião da Silva e Moacir Laurentino pelas mãos de outro mestre e gênio dos
versos, o poeta Zé de Cazuza. Valdir logo expôs seu talento nato e foi
convidado a apresentar um programa de rádio na cidade de Patos, quando
aproveitou a oportunidade para fixar residência no município paraibano.
A partir de então,
o talento de Valdir Teles deslanchou, revelando-se como um dos maiores
representantes do seu gênero no Nordeste. Ao lado de Lucio Silva, companheiro
de viola, gravou seu primeiro LP, e tornou-se figura popular não só nas rádios
onde conduzia programas, mas também em grandes eventos de cantoria, congressos
e festivais.
No ano de 1993,
Valdir escolheu Tuparetama para residir. Já neste ano, reunia em seu leque um
extenso elenco de confrades como Santana, Maciel Melo, Flávio José, Raimundo
Fagner, e tantos outros cantadores genuinamente nordestinos. No microfone e na
viola sempre dividia, seja no palco ou no alpendre, a cantoria com grandes
nomes do universo da poesia popular, a exemplo de Louro do Pajeú, Ivanildo Vila
Nova, Sebastião Dias, Sebastião da Silva, Zé Viola, Geraldo Amâncio e Zé
Cardoso.
Detentor de mais
de 500 troféus e tantas outras centenas de justas honrarias, Valdir levou a sua
arte, carregada de sotaque e sentimento, para inúmeros países da Europa, da
América Latina e as mais diversas regiões do Brasil.
Todo
acontecimento, do mais simples ao mais relevante, era mote para o rico talento
de Valdir florear. Seja o seu amado sertão e suas nuances; seja a natureza que
reúne a beleza da vegetação nativa; seja a religiosidade, que une todos em
torno da fé; seja todas as coisas que ao nosso enxergar parece diminuto, mas
para a visão do poeta é gigante, tornando-se verso que emociona.
No fim do entardecer
do dia 22 de março de 2020, aos 64 anos, Valdir Teles foi golpeado pelo
destino. Enquanto se resguardava na Serrinha para prevenir o contágio do
Covid-19, o poeta sofreu um infarto fulminante. E antes de desaparecer
precocemente, fez seu derradeiro verso sobre o “vírus da morte”, como o mesmo
denominou o coronavírus, emprestando seu talento e dando rimas bastante
regionais as formas da prevenção desta pandemia.
A tecnologia, de
certo modo, deixa público todo seu legado nas plataformas digitais, ficando
acessível as futuras gerações. Mas seu legado maior, vivo e pulsante fica em
forma de gente, com nome e sobrenome: Mariana Teles. A jovem advogada, além de
militar no campo das leis, é militante da poesia popular. “Escritora escrava do
verbo escreva”, como se autodenomina, Mariana herdou brilhantemente do seu pai
toda a arte e a sensibilidade que se traduz em rimas bem metrificadas.
Além de Mariana, deixa também Edilsa, Glaubênio e
Galderise, além de netos e a viúva, dona Elza. Os órfãos não se resumem apenas
nestes citados aqui. Valdir deixa uma legião incontável de amigos, seguidores e
admiradores, que aprendem sobre o poeta na escola. Hoje, ele se junta a um rol
de artistas como Louro do Pajeú e João Paraibano, passando a cantar e
improvisar com eles e tantos outros em novas dimensões do universo.